Louis Frankenberg,
CFP® 10.08.2012.
Praticamente todos nos precisamos de crédito.
Quando nosso filho
mais novo nasceu, eu me encontrava em momento profissional bastante volátil.
Encontrava-me numa
daquelas importantes encruzilhadas da vida.
Acabava de pedir
demissão de uma instituição financeira na qual ganhava um excelente salário e
tinha finalmente, após longa reflexão e preparação profissional, resolvido iniciar
carreira solo como planejador financeiro pessoal.
Meu orçamento
doméstico de despesas mensais era apertado, porém bem equacionado, porém
continuava pagando elevado aluguel por morar há pouco tempo em São Paulo.
Para o orçamento
apertado concorria inclusive que meus outros dois filhos, pouco maiores,
frequentavam uma escola particular em que eu pagava encargos bem salgados.
Resumindo meu dilema
de então;
Pouco ou nada sobrava no
fim de cada mês do meu elevado salário que, a partir da decisão de começar a
ser um profissional autônomo, deixaria de ser depositado automaticamente na
minha conta bancária.
Eu tinha apenas
amealhado até então somente uma pequena reserva financeira, depositada em um
fundo de investimento em ações e este era meu único pé de meia.
Não queria a não ser
em última instância apelar para esta reserva financeira.
Por esta mesma razão,
a boa intenção de continuar levando a vida sem prestações, juros e endividamento
infelizmente estava chegando ao fim e daí em diante me impulsionaria, contra a
vontade, a fazer parte da legião daqueles que tinham carnês de pagamentos
mensais, como era o costume (e continua sendo) da maioria da nossa população. O
advento do cartão de crédito ainda não havia chegado e quase todo mundo ainda
fazia uso do talão de cheques.
A sempre crescente inflação
concorria para que as taxas de juros que se pagava para as financeiras e bancos
no Brasil fossem já à época bastante elevadas.
Felizmente meu último
empregador permitiu que eu levantasse o FGTS, mas o montante foi insuficiente para
as prementes aquisições domésticas que tinha que fazer.
Estas seriam uma
máquina de lavar roupa para minha mulher e uma escrivaninha para meu novo escritório
improvisado na sala de estar da casa alugada, esta última com a finalidade de
dar o tiro de largada à minha nova profissão de planejador financeiro pessoal
autônomo.
Eu seria o primeiro a
desenvolver educação e planejamento financeiro em nosso país onde, devido a
esta mesma inflação, ninguém queria poupar e tentar criar reservas para o
futuro.
Não tive outra solução
a não ser apelar, como tantos outros paulistanos, para a salvadora Casa Mappin,
dos poucos magazines que naquela época oferecia crédito por intermédio de sua
financeira.
24 meses mais tarde de
idas ao centro da cidade e juros elevadíssimos nos separavam de sermos finalmente donos completos e
absolutos da escrivaninha e da máquina de lavar roupa.
Os dois anos de
orçamento doméstico extremamente apertado estavam chegando ao fim. Foi uma
dupla comemoração, o fim das prestações e o relativo sucesso que eu estava
tendo como planejador financeiro pessoal.
Chocado com o
resultado obtido após ter feito o cálculo, concluí de que poderia ter adquirido
duas escrivaninhas e duas maquinas de lavar roupa, caso tivesse tido dinheiro suficiente
para adquiri-los à vista.
Chegando em casa após
ter efetuado a 24ª e última prestação, disse para minha mulher;
“a partir de hoje não mais vamos comprar a prazo, pagando estes
estúpidos juros”. Não quero passar a
vida inteira trabalhando para gastar meus suados ganhos em juros!
Disse ainda que, a
partir daquele momento a regra em nossa casa iria ser a seguinte;
“se temos o dinheiro na
conta bancária adquirimos algo, se não temos não se gasta”.
E assim foi a partir
daquele momento.
O envolvimento de um profissional de planejamento financeiro
pessoal na educação financeira.
Os anos passaram e eu ia
evoluindo na profissão e realizando palestras e seminários para dezenas de
empresas e entidades. A economia do país também estava evoluindo
rapidamente, tornando-se mais estável a partir do advento da nova moeda, o
Real.
Aos poucos ia me
tornando um planejador financeiro conhecido nacionalmente, porém, até os dias
de hoje estou bronqueado por não poder fazer mais pelas classes menos favorecidas
do país, divulgando mais amplamente as maléficas consequências do endividamento
excessivo da população menos esclarecida.
Lembro-me jocosamente
de um episódio inesquecível em que o programa “Fantástico” da TV Globo
transmitiu ao vivo as imagens de uma família do Rio de Janeiro, endividada até
o pescoço, sentada em sua própria residência ao redor de uma mesa junto comigo.
Ante as câmaras fui
sendo filmado com uma imensa tesoura na mão, cortando os dois cartões de
crédito da esposa do chefe da família, e ao mesmo tempo fazendo-a prometer
solenemente de que nunca mais iria comprar a prazo!
Anos se passaram e as
pessoas ainda me relembram da história e, até hoje, os furiosos gestores de
cartões de crédito não me perdoaram por ter tido a petulância de fazer este
marketing tão adverso para este segmento das finanças!
O precursor da divulgação de pesquisas sobre inadimplência
Em 2.002, portanto faz
dez anos meu amigo e colega de diretoria Miguel de Oliveira, realizou e publicou
através da ANEFAC (Associação
Nacional de Executivos de Economia, Finanças e Contabilidade) a 1ª pesquisa que
concluía que as diversas classes sócio econômicas
de nosso país gastavam demais em juros.
A pesquisa demonstrava
que entre 1/3 e ¼ dos ganhos das famílias das diversas classes sócio econômicas
eram gastos com juros.
Na época relativamente
pouca atenção foi dada ao excelente trabalho do Miguel.
Ao contrário de hoje em
dia, as pesquisas a respeito das taxas de juros cobradas pelas diferentes
modalidades de endividamento, são amplamente divulgadas pela mídia também graças ao
Miguel e a própria ANEFAC.
Sinceramente eu não
conseguia acreditar na veracidade desta quantidade tão elevada de endividados em nosso país,
mesmo assim eu fazia questão de divulgar o estudo em minhas palestras e
seminários por meio de vistosos slides em Power point. Ainda faço uso do slide original, pois pouca coisa mudou nestes últimos anos.
Todo o trabalho de
convencimento que produzo e divulgo até os dias de hoje se alicerçam na minha
convicção de que ninguém, ninguém mesmo, deveria estar pagando conscientemente as elevadas taxas de
juros que continuam sendo ofertadas por algumas instituições financeiras,
apesar de aos poucos estarem sendo reduzidas.
A própria “Fundação Procon” de São Paulo,
horrorizada pelas milhares de histórias tristes
contadas por centenas de milhares de pessoas
super endividadas nestes muitos anos de atuação, atualmente está iniciando um
novo programa com a finalidade de educar
financeiramente pessoas super endividadas.
Espero que tenham
sucesso, pois diz o provérbio que “andorinha
só não faz verão” e eu estou cansado
de praticamente sozinho estar apregoando ensinamentos educacionais a respeito
do assunto.
Toda a nação deveria
estar imbuída da intenção de educar melhor nosso povo. Somente desta maneira
conseguiremos ser um país mais justo e progressista.
Pesquisas contraditórias e interesses ocultos.
Em 20 de Junho
último a Folha de S.Paulo publicou
um estudo da Serasa Experian e da FecomercioSP que afirmava que 77,2 % das
famílias estavam endividadas em
Maio de 2012, em S.Paulo, das quais 21,53 % estavam inadimplentes.
Pessoalmente penso
que jamais este Governo deveria ter iniciado recentemente uma nova campanha que
visa incentivar o consumo sem
simultaneamente introduzir um adequado plano nacional que também divulgasse que
o endividamento excessivo faz muito mal à saúde e ao bolso e simultaneamente explicasse em detalhe
o significado do termo “consumo consciente” e dos perigos do super
endividamento.
Eu teria gostado
mais e seria politicamente mais adequado se o incentivo ao maior consumo estivesse
relacionado às receitas e despesas do orçamento doméstico, alertando a
população contra excessos.
Incentivo para maior
consumo e boa administração do orçamento doméstico a meu ver são assuntos diametralmente
opostos, ou seja, absolutamente contraditórios.
Acredito que uma
nação com multidões de pessoas pobres e endividadas ainda é pior que um ciclo
de menor consumo!
Como profissional há
tantos anos militando também no segmento educacional, eu sabia de antemão que
uma população sem conhecimento e ensinamentos básicos de como conduzir seu
próprio orçamento doméstico, iria sucumbir à tentação de gastar excessivamente.
Lembro o que diz um antigo provérbio;
“Quem nunca comeu melado quando come se lambuza”
Jamais esta legião
de pessoas pertencentes às classes “C, D, e E” poderia sobreviver a esta campanha
governamental, tendente a induzir pessoas simples a avaliar com o devido cuidado
e antecipadamente as consequências de compras emocionais e muitas vezes prescindíveis.
Outra questão que me
preocupa é a diversidade de pesquisas existentes e totalmente contraditórias que
são produzidas por grande diversidade de entidades governamentais e privadas.
Elas me dão a
sensação de que nenhuma dessas entidades de fato consegue medir com competência e realismo todos
os aspectos importantes que esta questão merece.
Também me pergunto quem ganha e quais as
verdadeiras intenções de certas entidades governamentais, associações,
institutos, universidades, empresas comerciais etc que divulgam essas
pesquisas, estatísticas e estudos a respeito de crédito, inadimplência, perfil
de pessoas endividadas etc.
Quem ou quais serão
os verdadeiros interessses disfarçados que envolvem o endividamento e da inadimplência e quais as medidas
que deveriam ser adotadas para que não nos tornemos amanhã a próxima vítima de
créditos e empréstimos concedidos em excesso, como acontece atualmente na Itália,
Irlanda, Grécia, Portugal e quem sabe quais outros países do mundo?
·
Realçando este
meu ponto de vista da contradição existente a respeito do assunto, cito a
reportagem de 17 de Junho último publicado no “O Estado de S.Paulo”.
Na reportagem
daquele dia citam que 27,3 % das famílias estavam inadimplentes em Abril de
2012, de acordo com fontes do ”Banco
Central”.
·
No mesmo mês de
Abril, novamente segundo o “Banco
Central” e a Pesquisa do “CNI/IBOPE”,
32 % dos brasileiros tinham alguma espécie de dívida.
·
A “ANEFAC” na mesma reportagem divulgava
que a taxa de juros do cartão continuava firmemente nos absurdos 10,69 %
mensais, apesar de toda publicidade existente em torno da enorme redução havida
nas taxas de juros...
Não me julgo um
sociólogo e nem mesmo um profundo conhecedor dos hábitos de consumo das
diversas classes sócio econômicas, de todas as regiões deste nosso imenso país,
apesar de estudar e tentar entendê-los.
Aqui estou dando meu
próprio palpite e posso estar enganado ao afirmar que antes se gastava mais nos
itens alimentação, transporte e
habitação e agora se gasta mais em produtos
eletrônicos e assemelhados como, por exemplo, aquisição e uso de celulares,
equipamentos de som, computadores mais básicos, automóveis populares, grifes da
moda etc.
Todas as mudanças anunciadas por parte de agências
governamentais, associações, institutos, universidades etc estão sendo impulsionadas
não apenas pelo aumento relativo dos ganhos por parte das pessoas (nunca
esquecendo o fator inflacionário que anula parcialmente este ganho), porém muito
mais pelo oferecimento agressivo de crédito pelos bancos, financeiras e do comércio
em geral do que por outra razão.
O Jornal “Valor” de 1º de Agosto último publicou
uma reportagem mostrando a preocupação do FMI com o endividamento bancário dos
brasileiros e diz textualmente ”Fundo vê
risco de bolha com a expansão do crédito e queda de juros”.
É óbvio que para
pessoas menos letradas, uma simples notícia de queda dos juros divulgada pela
imprensa escrita ou TV atiça as mesmas a fazer novas aquisições sem levar em
conta as dívidas que ainda precisam ser pagas.
Os assuntos crédito,
juros, endividamento, inadimplência, consumo consciente e educação financeira são
mais do que importantes, são prioritárias para um país que deseja estar entre
as principais potências mundiais.
A
balbúrdia da definição de quem é classe média no Brasil
Com o conhecimento adquirido
nestes anos todos, não consigo acreditar que a classe média “C” tenha
efetivamente avançada com qualidade e em quantidade de uns anos para cá, tal
como está sendo apregoado.
Prefiro pensar que houve
isto sim, diversas alterações nos hábitos de consumo de itens e subitens de
produtos e serviços por parte de todas as classes sócias econômicas em
detrimento de novos itens, antes irrelevantes ou inexistentes.
Atualmente estão sendo
consideradas integrantes da classe “C”, famílias que ganham entre R$ 1.400 e R$
4.300 brutos mensais!
A meu ver, seria preferível
ou mais acertado dividir esta classe “C” em classe média baixa, classe média e
classe média alta, pois estudando o poder aquisitivo da classe média baixa com
renda bruta de R$ 1.400,00, não consigo imaginar que ela tenha poder aquisitivo
suficiente para se considerar como sendo classe “C”.
Não desejo,
entretanto, neste meu blog demasiadamente extenso, me estender mais a respeito
do assunto.
Uma imensidão de matérias, crônicas e
pesquisas foram publicadas a respeito do assunto nestes últimos anos e a meu ver, todas
controvertidas, duvidosas ou incompletas.
Vejamos muito resumidamente algumas delas;
·
Abro a última
edição da revista da “ACREFI” e a de
noticia que vejo me dá um verdadeiro arrepio na espinha, pois diz o seguinte;
“De acordo com a “Data
Popular”, 59,4% dos cartões de crédito estão nas mãos da classe “C”. Se for verdade é uma bomba de tempo.
·
Valor Econômico de 9/12/2011 – Pesquisa
encomendada pela CNA de Outubro de 2011, produzido pelo Instituto IPESPE
(Pesquisador Antonio Lavareda);
A
renda familiar da classe média se encontra entre R$1.200,0o e R$ 5.200,00
·
Valor Econômico de 5/3/2012- Renda vai
definir o tamanho da classe média, em que é afirmada de que ninguém sabe o
tamanho real da massa de brasileiros que pertencem a essa mesma classe
média. Talvez sejam entre 43% e 55% da
população.
O
estudo se baseia na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Trata-se de um estudo sofisticado
que adota 36 critérios e tentaestabelecer
Inovações no critério, segundo a diretora da Secretaria de Assuntos
Estratégicos (SAE), segundo a pesquisadora Diana Grosner.
·
A Folha
de S.Paulo, caderno B 4 (Finanças Pessoais) de 13/2/2012 publica matéria de
Marcia Dessen afirmando que a classe média com ganha entre 4 e 10 salários
mínimos, e constituída por 101 milhões de pessoas não está conseguindo pagar
suas dívidas e afirma que 7,5% das pessoas de acordo com o Banco Central estão
inadimplentes.
·
A Serasa-Experian em conjunto com o “Instituto Geoc” e a “Voz do Consumidor” confirmaram que 42
milhões de CPFs tinham alguma forma de restrição em relação a endividamento ou
não pagamento de débitos, representando igualmente 42% da nossa população.
55%
dos endividados davam preferência em pagar através dos bancos e35% através dos varejistas.
·
No final de Julho
de 2012 estive pessoalmente em São Luiz do Maranhão, sabidamente um dos estados
mais pobres de nossa Federação. Em 25 de Julho abro o jornal “O Imparcial” cuja principal manchete
era; “São Luiz, Capital dos Endividados”, seguido por algumas constatações de
pesquisas locais.Mais de 229 mil famílias endividadas...
Como planejador financeiro espero que algum dia nossos
atuais e futuros governos acordam para por todas estes diferentes critérios em ordem,
racionalizando-as.
Termino este controvertido ensaio a respeito destas
importantes questões tão fundamentais com um apelo aos meus caros leitores;
Eduquem seus filhos e pessoas que lhes cercam para
terem hábitos maissaudáveis, financeiramente falando, dando-lhes os instrumentos de que
precisam para um futuro melhor, mais tranquilo e mais seguro.
Mando-lhes um abraço fraternal,
Blog; seufuturofinanceiro.blogspot.com
Nenhum comentário:
Postar um comentário